Apercebo-me agora das vantagens de andar a pé pela cidade.
Olha-se, observa-se, pára-se.
Tenho tempo para ver coisas que por detrás de um pára-brisas não me detenho, não ligo, não quero saber. Os ângulos confundem-se, misturam-se, desligam-se da realidade ou a posição de sentado para a do caminhante permitem outras perspectivas sobre a vida.
Tenho novos pensamentos, posso mesmo afirmar que nascem pensamentos diariamente da observação que faço, e este exercicio está a tornar-se tão agradável, que já acontece naturalmente.
Evidentemente, também há um lado negro.
Vejo miséria, muitos sem-abrigo, animais abandonados, casas em derrocada, miúdos a pedir e a drogarem-se.
Mas o mundo é isto. Uma tela de cores suaves e pinceladas de tons fortes para espevitar. Não vale a pena esconder o quadro no sotão só porque não vai bem com o resto da mobilia. Vai continuar sempre a ser um quadro.